BA:Justiça manda para júri homem que matou vítima porque esta não pagou aposta de R$ 10,00
DECISÃO
Vistos etc.
O Ministério
Público ofereceu denuncia em face de J.A.C.S,
qualificado nos autos, pela prática do crime previsto no art.
121, § 2º, § II
do CP.
Narra a
denúncia, em síntese, que o acusado, no
dia 26/11/16, por volta das 01:00h, na localidade denominada Povoado
de Benedito, zona rural do município de Acajutiba-BA, desferiu
contra a vítima, SEBASTIÃO DO SANTOS, um disparo de arma de fogo
que, segundo Laudo da Necrópsia o atingiu a altura do abdômen,
produzindo a lesão que ocasionou a sua morte.
Informa da denúncia que o
acusado, no dia do crime, discutiu com a vítima por conta de uma
aposta que ocorrera antes e cujo valor estava em posse da vítima.
Após a discussão que ocorreu no “Bar de Val”, o acusado e a
vítima saíram do estabelecimento, sendo que, logo depois o acusado
retornou procurando pela vítima, e esta, não sabendo que o
denunciado encontrava-se armado, foi ao seu encontro, momento em que
o réu atirou em direção à vítima acertando-lhe na região do
abdômen.
Requer que o réu seja pronunciado
e submetido a júri popular com sua condenação ao final.
A denúncia foi
ofertada com lastro em inquérito policial (fls.
04/39),
cujas peças principais são: portaria (fls.
05);
auto de exibição e apreensão (fls.
11);
nota de culpa (fls.
14);
termo de declarações (fls.
09/10; 19/22);
termos de assentada (fls.
11/18);
termo de interrogatório (fls. 23/24);
boletim individual (fls 32);
relatório (fls.
34/38).
O
Laudo de Exame Cadavérico às fls.
25/26.
Em
22 de fevereiro de 2017
foi recebida a denúncia em face do denunciado e determinado sua
citação, bem como determinada sua prisão preventiva (fls.
45/47).
Antes da
citação do réu, seu advogado apresentou defesa, o que, conforme
precedentes das cortes superiores supre a citação por mandado
judicial, sendo, portanto, qualificado e interrogado às fls.
74/78,
e confessou que teria desferido o disparo de arma de fogo que veio a
causar a morte da vítima, Sebastião dos Santos.
Defesa
prévia às fls.
51/54,
na qual alega Legítima Defesa do acusado e apresenta rol de
testemunhas.
Realizada
audiência para oitiva das testemunhas de acusação, foram ouvidos XXXX (fls.
75/78)
e, na mesma audiência foi realizada a oitiva das testemunhas de
defesa, onde foram ouvidas XXXXXX.
Alegações
finais do MP às fls.
79/86
aduzindo, em suma, que ficou
evidenciado a materialidade do fato por exame cadavérico (fl.
75/76), bem como a autoria por confissão do réu e por prova
testemunhal.
Requer a
pronúncia do réu para que ele seja julgado e condenado pelo
Tribunal do Júri nas sanções constantes do art.
121, § 2º, II do CP.
A defesa também
apresentou alegações finais às fls.
87/91
pedindo, em resumo, a absolvição do réu que agiu em legítima
defesa e se valeu do único instrumento que tinha no momento para se
defender, sua espingarda, que era por ele utilizada para caça.
É o relatório. Passo a
decidir.
Cuida-se de
ação penal movida pelo Ministério Público em face de J.A.C.S,
qualificado nos autos, pela prática do crime previsto no art.
121,
121,
§ 2º, II,
do CP, tendo como vítima fatal XXX.
A peça acusatória atribui ao réu
o crime de homicídio qualificado.
Não há
preliminares a serem apreciadas.
O art. 413 do CPP estabelece que o
juiz pronunciará o réu quando se convencer da existência do delito
e houver indícios de ele ser o autor, sendo vedado ao julgador a
análise aprofundada do mérito da questão, haja vista que tal
premissa, por imperativo constitucional, cabe aos integrantes do
Conselho de Sentença do Júri Popular.
Procedendo-se,
portanto, a atenta análise dos autos, verifica-se que a
materialidade do fato está demonstrada pelo laudo de exame
cadavérico da vítima de fls.
25/26,
na medida em que foi encontrada perfurações que ocasionaram lesões
do abdômen provenientes de
18 (dezoito) projéteis,
cuja causa da morte declinada foi como sendo ocasionada por tal ação
perfurocortante.
Assim,
comprovada a morte da vítima, isto é, materialidade do fato,
passa-se à sua autoria..
No que tange à
autoria, a mesma foi descoberta sem maiores dificuldades, ante
a confissão do acusado em interrogatório, onde relatou as
circunstâncias em que ocorreu o óbito da vítima e disse ter sido o
autor do disparo que o vitimou.
O acusado disse
em juízo o seguinte litteris:
“que
foi ele que atirou e matou o Sr. Sebastião; que a vítima foi morta
no rol da casa; que o interrogado atirou e depois saiu correndo em
fuga; que fugiu para Salvador depois do crime; que
o motivo foi porque a vítima escondeu R$ 10,00 da aposta para pagar
a cerveja;
que depois da discussão no bar onde estavam ele pegou sua moto e
retornou para a casa; que quando a vítima chegou na sua casa ele a
vítima chegou na porta de seu bar lhe repetia “pare aí seu
corninho”; que entrou para sua casa e pegou a espingarda disparou
contra a vítima; que era amigo da vítima e de sua família; que a
arma já estava carregada.” -- INTERROGATÓRIO DO ACUSADO ÀS FLS.
78 (gravação audiovisual).
As testemunhas 06 testemunhas XXXX FLS. 78 (gravação audiovisual), confirmam os fatos narrados na
acusação.
Desta forma, havendo prova da
existência do fato delituoso e indícios de que o acusado é seu
autor, resta apenas apreciar o pedido de absolvição da defesa.
Segundo dispõe o art. 411 do CPP,
o juiz pode absolver desde logo o réu quando se convencer da
existência de circunstância que exclua o crime ou isente de pena o
réu.
No entanto, para o reconhecimento
da absolvição com base na legítima defesa é mister que haja prova
perfeitamente convincente da presença da causa de exclusão do
crime, de modo que a formulação de um juízo de admissibilidade da
acusação represente manifesta injustiça.
No caso em
testilha, isso não ocorre, pois, não há certeza sobre a existência
da mesma.
Sobre a
necessidade da legítima defesa ficar assente de dúvidas nesta fase
para se permitir a absolvição se pode transcrever os seguintes
julgados verbis:
“PROCESSO
PENAL - RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - ARTIGO 121, CAPUT, DO CP.
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA - LEGÍTIMA DEFESA. EXCLUDENTE QUE NÃO AFLORA
DE FORMA INEQUÍVOCA. MAIS DE UMA VERSÃO ACERCA DOS FATOS. EXCLUSÃO
DA QUALIFICADORA DE MOTIVO FÚTIL - IMPOSSIBILIDADE. RECURSOS NÃO
PROVIDOS. UNÂNIME.
Se, da prova colhida no curso da
instrução, a alegada legítima defesa não aflora de maneira clara
e inequívoca, não se podendo afirmar que o agente estivesse a
repelir injusta agressão atual ou iminente e que tenha usado
moderadamente dos meios necessários para tanto, não se cogita de
absolvição sumária. Na hipótese de haver duas ou mais versões
acerca de como um dos acusados haveria entregado a arma ao outro,
competente é o Tribunal do Júri para decidir qual lhe pareça mais
verossímil. A qualificadora, no juízo da pronúncia, somente pode
ser excluída se estiver manifestamente divorciada do contexto dos
autos.” (TJDFT-021274, Recurso em Sentido Estrito nº
20020510081383 (242653), 2ª Turma Criminal do TJDFT, Rel. Romão C.
Oliveira. j. 12.01.2006, DJU 11.05.2006).
“PROCESSUAL
PENAL. HOMICÍDIO. MATERIALIDADE E AUTORIA. SUFICIÊNCIA DA PROVA.
EXCLUDENTE DO CRIME. INCERTEZA. PRINCÍPIO IN DUBIO PRO SOCIETATE.
APLICAÇÃO. HIPÓTESE DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. INOCORRÊNCIA.
DECISÃO DE PRONÚNCIA. CONFIRMAÇÃO. COMPETÊNCIA DO JÚRI.
RECURSO. IMPROVIMENTO.
1. Demonstrada a materialidade do
homicídio e inexistindo questionamento sobre a autoria, por força
do princípio in dubio pro societate, não há lugar para se cogitar
de absolvição sumária quando houver dúvida sobre a alegada
legítima defesa, sendo imperioso, ao contrário, a confirmação da
pronúncia, eis que, nesse juízo de admissibilidade da acusação, a
existência de incertezas remete a discussão para o Júri Popular,
juiz natural que é dos crimes dolosos contra a vida.
(...)
Logo, estando
comprovada a materialidade do fato e os indícios suficientes de
autoria, onde
o réu assume ter
desferido
o disparo de espingarda na vítima, causando-lhe a morte,
não
estando cabalmente comprovadas circunstâncias que excluam o crime ou
isentem de pena o réu, deve o réu ser pronunciado e levado a Júri
Popular.
Assim, nesta
primeira fase, o juízo deve manifestar-se em prol da sociedade,
ficando o princípio secular do in
dubio pro reo, caso
haja dúvida,
para
a segunda fase do processo de competência do Tribunal do Júri.
Ressalte-se
que, “como juízo de admissibilidade, não é necessário à
Pronúncia que exista a certeza que se exige para a condenação. Daí
que não vige o princípio do in
dubio pro reo,
mas se resolvem em favor da sociedade as eventuais incertezas
propiciadas pela prova, ou seja, in
dubio pro societate”. (Tristão, Adalto em Sentença Criminal, 6ª
Edição, Editora Del Rey, pg.261).
Quanto
à(s) qualificadora(s) prevista(s) no art. 121, § 2º, inciso II
(motivo fútil) , do Código Penal Brasileiro, somente deve ser
repelida(s) quando manifestamente improcedente(s).
A
referida qualificadora devem ser submetidas ao Tribunal do Júri.
Limito-me a não tecer maiores comentários nem digressões acerca da
mesma, a fim de não influenciar, indevidamente, na soberana decisão
dos Srs. Jurados componentes do Conselho de Sentença.
Pelo exposto,
com fundamento no art. 413 do Código de Processo Penal, tenho por
PRONUNCIAR
o réu,
qualificado nos autos, pela prática do crime previsto no art.
121, § 2.º, II (motivo
fútil),
do CP, para que seja submetido a julgamento pelos seus pares, pelos
fundamentos acima aduzidos.
Publique-se. Registre-se.
Intimem-se.
Esplanada/BA, 28 de fevereiro de
2018.
Juiz de Direito em Substituição
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