Ministério Público pede suspensão das carreatas e passeatas eleitorais em Crisópolis-BA
"EXMO.
SR. DR. JUIZ ELEITORAL DA 81ª ZONA _ OLINDINA/BAHIA
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, por
intermédio do Promotor de Justiça Eleitoral infrafirmado, que
poderá ser encontrado para as intimações e notificações pessoais
na sede da Promotoria de Justiça da Comarca de Olindina, situada no
Fórum local, no regular exercício da delegação legal e
constitucional que lhe é conferida pelo art. 78 da LC nº 75/93, e
com arrimo no art. 127, caput, da CF de 1988, vem, à presença de
Vossa Excelência, respeitosamente, com fundamento também nos arts.
35, inc. IV e V, do Código Eleitoral e 96, da Lei 9.504/97, propor
REPRESENTAÇÃO CONTRA PROPAGANDAS/MANIFESTAÇÕES ELEITORAIS
ILÍCITAS, em desfavor de todas as coligações e candidatos a cargo
eletivos nas cidades de Crisópolis, objetivando a
proibição/suspensão temporária de carreatas e passeatas, até a
chegada nas cidades de reforço policial necessário ao transcorrer
tranquilo do pleito e do período que o antecede, dentre outros
pleitos, em razão dos fundamentos de fato e de direito a seguir
aduzidos:
O Ministério Público Eleitoral e a
Justiça Eleitoral vêm realizando diversas audiências públicas com
os partidos e coligações dos Municípios que integram a Zona, a
saber: Olindina, Crisópolis e Itapicuru, aonde são repassadas
instruções e a posição da Justiça Eleitoral frente a várias
situações ocorridas nos Municípios por ocasião das eleições.
São os presentes alertados sobre crimes eleitorais e condutas
vedadas no período eleitoral. A oportunidade serve também como
canal para que a população nos comunique suas dúvidas e também
realize suas denúncias, quando na ocasião também são orientados
sobre a forma como devem formalizar a notícia sobre fatos que
afrontem a legislação.
No último dia 02 de outubro, quando
se promovia reunião na Câmara de Vereadores da cidade de
Crisópolis, foi noticiado publicamente pela candidata à vereança
Mércia que em evento político (carreata) promovido pela coligação
a que faz parte houve disparos de arma de fogo e que tal fato estaria
sendo comunicado formalmente à Policia Civil para os procedimentos
de praxe. Na ocasião não apontou responsáveis diretos.
Ocorre que nesse dia 03 de outubro,
nos dias que já avizinham ao dia do pleito, chegou ao conhecimento
da Justiça Eleitoral, no que foram tomadas à termo as declarações
com a presença do Ministério público Eleitoral, que as pessoas XXXXXX teriam sido
ameaçados por seguranças armados do então candidato da situação
Prefeito José Santana.
Segundo fora relatado, os
denunciantes estavam retornando para a cidade de Crisópolis vindos
da cidade de Olindina quando encontraram a carreata promovida pelo
partido do então Prefeito candidato a reeleição, quando teriam
parado seu veículo no acostamento para aguardarem a passagem do
evento político. XXXXX foram ao encontro do veículo aonde se encontravam os
comunicantes, no que passaram a ameaçar e tentado retirar a força a
vítima XXXXX, no que todos passaram a gritar e trancar as portas do
veículo, o que não impediu dos dois indivíduos continuarem a
forçar com especial brutalidade a abertura das portas do veículo.
Segundo noticiado, a fim de
intimidar, o indivíduo conhecido por “XXXX” levantou a sua
camisa deixando revelar que estar armado, no que causou grande medo
nos presentes, que a muito custo conseguiram empreender fuga do ocal.
Ocorre que não se trata de desavença
pessoal entre o ofendido Djalma e o suposto agressor denominado
“XXX”, tratou-se em verdade de violência provocada em virtude
das disputas eleitorais, pois, como afirmado pelos declarantes, as
intimidações começaram quando o ofendido XXXXX passou a declarar
estar apoiando o partido da legenda de número XXXX, o que teria
provocado a fúria da legenda de número “XXX, da qual são
apoiadores as pessoas apontadas como agressoras nesta ocasião.
Foi revelado ainda que os grupos
políticos vem se valendo das redes sociais (Facebook) para proferir
ameaças, zombarias e realizar provocações, uns contra os outros.
Os comunicantes ainda confirmaram ter
havido um episódio de violência no povoado “Buril”, aonde
pessoa desconhecida teria deflagrado disparos de arma de fogo contra
a residência de uma senhora moradora do local e que a Polícia já
teria comparecido ao local para averiguar os fatos e colher provas.
Tal fato teria ocorrido também por ocasião de uma carreata.
De todo o relatado e pelo o que é
conhecido extra-autos, nota-se que, apesar da falta de comunicação
por parte da população e dos candidatos e delegados de partido, a
violência já se instalou no Município de Crisópolis alimentada
pelo acirramento das disputas eleitorais. Releva sublinhar que se
trata de Município extremamente violento, com número acentuado de
homicídios (16 no ano de 2010; 10 no ano de 2011 e 06 nesse ano, até
a presente data) o que, confrontado com o pequeno efetivo Policial
(segundo o Comandante do grupamento local seriam quatro) se revela
que quela Municipalidade é uma verdeira panela de pressão pronta à
explodir por conta das eleições. O grande número de motocicletas
irregulares e sem documentação viriam ainda a auxiliar no anonimato
de eventuais crimes.
Além disso, o que já é ruim –
contingente da polícia no interior do Estado -, em épocas
eleitorais fica pior ainda, porque diversos policiais se afastaram de
suas funções para concorrerem a cargos eletivos.
Além disso, se os ânimos já estão
acirrados, sabe-se que a reunião de multidões rivais facilita a
ocorrência de crimes graves, como os abaixo descritos,
principalmente numa ambiência de pouco policiamento. O fato de a
reunião de multidões incentivar a criminalidade é conhecido a
centenas de anos na criminologia, segundo se infere dos escólios da
doutrina adiante citados:
Juarez Cirino dos Santos –
Situações de multidão em tumulto podem liberar instintos
agressivos individuais – normalmente contidos pela ação
controladora do superego -, estimulados pela pressão da massa e pelo
anonimato pessoal, que reduzem o poder de controle sobre o
comportamento1.
Rogério Greco – A ação do
grupo pode, muitas vezes, influenciar o agente ao cometimento da
infração penal. (...) na multidão em tumulto o comportamento do
indivíduo deixa de ser o próprio para ser aquele da própria
multidão2.
Ora, paixões políticas acirradas,
típicas de regiões interioranas, somadas às tensões crescentes,
decorrentes da proximidade do pleito, temperadas com a ausência
estatal, representada pelo diminuto contingente de policiais, que,
embora esforçados, não conseguem lidar com o aumento da
criminalidade decorrente do estímulo das massas, exige, além do
deferimento do reforço do policiamento, uma restrição, temporária,
do direito de manifestação política.
RESTRIÇÃO ESTA PARCIAL. IN CASU NÃO
ESTAMOS REQUERENDO A PROIBIÇÃO DE TODA E QUALQUER MANIFESTAÇÃO
POLÍTICA, MUITO MENOS ESTAMOS CENSURANDO A MANIFESTAÇÃO DO
PENSAMENTO. ESTAMOS REQUERENDO, APENAS E TÃO SOMENTE, A SUSPENSÃO
PROVISÓRIA DO DIREITO DE REALIZAR PASSEATAS E CARREATAS, ATÉ QUE SE
OBTENHA CONTINGENTE POLICIAL NECESSÁRIO PARA SE RESGUARDAR A ORDEM
PÚBLICA E A SEGURANÇA DA SOCIEDADE. TRATA-SE, POIS, DE MEDIDA
EMERGENCIAL, PROVISÓRIA.
Não estamos requerendo, por exemplo,
a suspensão do direito de realizar comícios estáticos, muito menos
o direito de manifestar a preferência do voto pelos meios lícitos,
mas, somente, a suspensão do direito de se realizar carreatas e
passeatas, as quais trazem consigo uma dificuldade específica para o
policiamento.
A movimentação constante de
pessoas, principalmente numa realidade de contingente policial
limitado, inviabiliza a efetivação de plano de segurança eficaz,
com identificação de vulnerabilidades e pontos ideais para a
instalação de policiais.
A movimentação de pessoas expõe a
risco também os participantes da carreata, os quais ficam mais
expostos a riscos externo, já que a cada rua pode existir um
contentor pronto para a prática de crimes.
Não há que se falar, ademais, em
direitos absolutos. Além disso, a restrição in casu é
parcial e temporária, a qual não vulnera o princípio da
razoabilidade. Na prática os
direito de manifestação e de reunião sofrerão limitações
mínimas, já que será possível a realização de comícios e
inaugurações de comitês, eventos de fácil fiscalização, porque
estáticos, vedando-se, apenas, e mesmo assim temporariamente, a
realização da carreatas e passeatas (até a chegada do reforço
policial requerido).
A própria suspensão da realização
destes eventos possui caráter didático para os candidatos e
coligações.
No caso, o direito de reunião
cederia pequeno espaço para a segurança pública, restabelecendo-se
a ordem. Além do mais, não se pode estabelecer uma hierarquia
absoluta entre princípios constitucionais, resolvendo-se eventuais
conflitos e colisões ante as especificidades e peculiaridades de
cada caso. A esse respeito, insta trazer a colação o magistério
dos Professores Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho e
Paulo Gustavo Gonet Branco, ipsi literis:
Não há, portanto, em princípio,
que falar, entre nós, em direitos absolutos. Tanto outros direitos
fundamentais como valores com sede constitucionais podem limitá-lo
(p. 241). É importante perceber que a prevalência de um direito
sobre o outro se determina em função das peculiaridades do caso
concreto. Não existe um critério de solução de conflitos válido
em termos abstratos (p. 286)33.
Assim sendo, entendemos que o direito
de reunião cederia pequeno espaço aos postulados da segurança e da
ordem públicas, mesmo porque aquele primeiro não será totalmente
suprimido, ao contrário, já que preservado o seu núcleo essencial.
Não haverá, portanto, proteção
deficiente, muito menos limitação excessiva, respeitando-se, desta
maneira, os postulados da razoabilidade e da proporcionalidade. Além
disso, a realização excessiva de carretadas e caminhadas também
limita o direito de circulação do cidadão, o qual, por vezes, fica
impedido de transitar livremente.
Sobre o tema, vale colacionar:
“Modernamente, não se estranha
a relatividade de muitos direitos da personalidade. De absolutos que
eram no conceito liberal de 1789, quando a única limitação que
sofriam era o direito de outrem, foram, aos poucos, se relativizando
por força das exigências sociais e em atenção ao bem comum, de
sorte que, na concepção atual, segundo demonstra Ada Pelegrini
Grinover, o ordenamento jurídico de um país se considera como
sistema de limitações recíprocas dos diversos direitos subjetivos
nele existentes.” (Sérgio Carlos Covello. O Sigilo Bancário, 2.
edição., Leud, SP, 2001. p. 165).
Debruçando-se sobre a questão, o
colendo Supremo Tribunal Federal, abraçando a tendência mundial
restritiva, já decidiu:
[...] não há, no sistema
constitucional brasileiro, direitos ou garantias que se revistam de
caráter absoluto, mesmo porque razões de relevante interesse
público ou exigências derivadas do princípio de convivência das
liberdades legitimam, ainda que excepcionalmente, a adoção, por
parte de órgãos estatais, de medidas restritivas das prerrogativas
individuais ou coletivas, desde que respeitados os termos
estabelecidos pela própria Constituição. O estatuto constitucional
das liberdades públicas, ao delinear o regime jurídico a que estas
estão sujeitas - e considerando o substrato ético que as informa -
, permite que sobre elas incidam limitações de ordem jurídica,
destinadas, de um lado, a proteger a integridade do interesse social,
e do outro, a assegurar a coexistência harmoniosa das liberdades,
pois nenhum direito ou garantia pode ser exercido em detrimento da
ordem pública ou com desrespeito aos direitos e garantias de
terceiros4.
Além disso, restaria caracterizado
in casu manifestou abuso de direito, figura expressamente
prevista no ordenamento jurídico.
Apesar de a propaganda mediante
carros de som, carreatas e passeatas não serem ainda práticas
vedadas pela legislação, o abuso deste direito fere frontalmente
direitos dos cidadãos, eleitores ou não, ao meio ambiente saudável
constitucionalmente garantido, com emissão de sons dentro dos níveis
determinados na lei ambiental, e ao direito de não ser vítima de
crimes, como agressões, ameaças, etc.
Como os órgãos de segurança
pública nos Municípios são incapazes de manter a ordem e a
segurança da população na organização de eventos da magnitude
das carreatas, resta claro que a realização deste tipo de evento,
com a estrutura existente hoje, é impraticável. Sem dúvidas, acima
do direito de realizar propaganda política está a incolumidade
pública e a manutenção da ordem legal.
O novo Código Civil dispõe que o
abuso de direito é verdadeiro ato ilícito: “(...) também comete
ato ilícito o titular de um direito que ao exercê-lo excede
manifestamente os limites (...)5”.
Assim é que nos deparamos com a
preocupação dos juristas, como Miguel Reale6, na sua Teoria
Tridimensionalista do Direito, em consagrar a ética como instrumento
condicionante da aplicação da lei. Não por outra razão, as
legislações modernas, ao lado das normas técnico-formalistas, vêm
prevendo institutos agregadores de princípios valorativos essenciais
à afirmação da Justiça nas relações humanas. É o caso da
Função Social da Propriedade, da Função Social do Contrato, da
Teoria da Imprevisão, da Teoria da Lesão Enorme, dentre outros.
Foi também nesse cenário que se
consolidou a Teoria do Abuso de Direito, construída sob a simples
ilação “o meu direito termina quando começa o do outro”.
Superando o ideal burguês de afirmação das liberdades públicas,
em que se edificaram direitos subjetivos absolutos, intangíveis, os
imperativos da convivência em sociedade inspiraram a moral hodierna
a exigir a relativização dos interesses. Do individualismo ao
socialismo. Em caso, prevalecem o direito ao sossego público e à
segurança da população sobre o abusivo direito à propaganda
exercido erroneamente pelos candidatos.
Mesmo que não considerada supremacia
do interesse público, na vedação momentânea das carreatas e
passeatas, impõe-se o reconhecimento do abuso de direito perpetrados
pelos organizadores e participantes deste tipo de evento.
Não podem os candidatos, sob a
alegação de possuírem o direito de realizar carreatas, causar a
conturbação da ordem pública e impingir risco à população,
principalmente daqueles que participam do evento.
Tais violações à ordem pública e
a lei eleitoral devem ser sanadas por meio do poder de polícia,
atribuído à Justiça Eleitoral.
Os juízes e tribunais eleitorais
encontram-se investidos da competência administrativa conhecida como
"poder de polícia", atribuição que exercem, inclusive de
ofício, notadamente para corrigir de pronto abusos no exercício do
direito de propaganda eleitoral por partidos e candidatos (Código
Eleitoral, artigo 249) e para, durante o procedimento de votação,
coibir atos atentatórios à liberdade do voto (Código Eleitoral,
artigos 139-41).
No caso em apreço, não há outra
forma de cercear a prática do ilícito, se não pelo exercício do
poder de polícia. Com efeito, a campanha eleitoral está próxima de
seu fim, faz-se necessária medida enérgica e urgente para coibir a
perpetuação do ilícito aqui apresentado. Tal conduta, se
persistir, provocará o desequilíbrio no pleito eleitoral, afetando
a normalidade e legitimidade das eleições, por isso merece ser
coibido pela Justiça Eleitoral, na linha do que já decidiu a
jurisprudência:
Os Juízes – Membros de
Coordenação de Fiscalização da Propaganda Eleitoral, BEM COMO OS
DEMAIS JUÍZES ELEITORAIS, TÊM PODER DE POLÍCIA, INCLUSIVE
PREVENTIVO, para determinar a retirada de propaganda eleitoral
irregular, não podendo, contudo, deflagrar processo visando à
imposição da multa prevista no art. 37 da Lei n. 9.504/1997,
consoante precedente do Tribunal Superior Eleitoral (REsp n. 15.864,
Acórdão n. 15.864, Rel. Min. Edson Vidigal, DJ de 6.8.1999).
O poder de polícia em que se investe
o juiz eleitoral não lhe dá legitimidade para instaurar, de ofício,
procedimento judicial por veiculação de propaganda eleitoral em
desacordo com a Lei nº 9.504/97 (súmula TSE, Verbete nº 18).
Recurso em mandado de segurança –
Afixação de placas em passarelas e viadutos - Minidoor -
Determinação para retirada – Coordenação de Fiscalização da
Propaganda Eleitoral - Possibilidade.
(...) 2. O poder de polícia, que não
depende de provocação, deve ser exercido quando o juiz eleitoral
considerar haver irregularidade, perigo de dano ao bem público ou ao
bom andamento do tráfego.
Registre-se ainda que, segundo nos
foi noticiado, as coligações estão agindo em flagrante abuso de
direito, ferindo frontalmente o art. 5º, XVI, da CRFB, já que
estariam se reunindo sem comunicação prévia à Polícia e
desrespeitando aciordo já celebrado na presença deste Juízo quanto
à datas pré-determinadas para a realização de comícios e
carreatas, SE REÚNEM TAMBÉM COM O OBJETIVO DE FRUSTRAREM REUNIÕES
MARCADAS PREVIAMENTE, E SEM FINS PACÍFICOS:
XVI - todos podem reunir-se
pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público,
independentemente de autorização, desde que não frustrem outra
reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas
exigido prévio aviso à autoridade competente;
Para se ter uma ideia da deficiência
na segurança no Município de Crisópolis, A ONU RECOMENDA UM
POLICIAL PARA CADA 250 (DUZENTOS E CINQUENTA) HABITANTES. OU SEJA,
SEGUNDO A ONU, ORDINARIAMENTE, SEM A VERIFICAÇÃO DE SITUAÇÃO
EXCEPCIONAL, SÓ O MUNICÍPIO DE CRISÓPOLIS DEVERIA ESTAR SENDO
SERVIDO POR 100 (CEM) POLICIAIS. Ora, in casu, onde estamos diante de
situação excepcional, o contingente deveria ser maior ainda. As
carretas e passeatas, por seu turno, reúnem milhares de pessoas.
Diante da gravidade da situação,
não pode o Ministério Público ser irresponsável, a pretexto de
defender a suposta liberdade de manifestação e reunião, colocando
em risco a vida de milhares de inocentes e de alguns nem tão
inocentes assim, ao contrário. Não há que se proteger, ademais, o
direito de quem dele abusa, de maneira grave, inclusive.
A segurança pública foi alçada, na
Constituição Federal de 1988, à condição de direito fundamental
e social dos cidadãos, dever do Estado, direito e responsabilidade
de todos, a fim de garantir, segundo o disposto no artigo 144, a
preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio.
O legislador constituinte originário,
nos §§ 5º e 6º, do aludido dispositivo, asseverou também que
ficaria a cargo da Polícia Militar o policiamento ostensivo e a
preservação da ordem pública, subordinado-se a mesma ao Governo
dos Estados Federados. O art. 144 da Constituição Federal de 1988,
assim prescreve, in verbis:
Art. 144. A segurança pública,
dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida
para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas
e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
V - polícias militares e corpos de
bombeiros militares.
§ 5º - às polícias militares
cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos
corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em
lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
§ 6º - As polícias militares e
corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do
Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos
Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
A Constituição do Estado da Bahia,
neste mesmo diapasão, em seu art. 11, inciso III, aduziu que a
segurança pública é matéria de competência do Estado, sendo seu
dever organizar e manter a Polícia Militar, cujo campo de atuação
fora delimitado nos artigos 146 e 148 deste mesmo diploma normativo.
Vejamos o que dispõe a Constituição
Estadual, verbo ad verbum:
Art. 11 - Compete ao Estado, além de
todos os poderes que não lhe sejam vedados pela Constituição
Federal: III - manter a ordem jurídica democrática e a segurança
pública; Art. 146 - A segurança pública, dever do Estado, direito
e responsabilidade de todos, é exercida para preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio.7 Art. 148 -
À Polícia Militar, força pública estadual, instituição
permanente, organizada com base na hierarquia e disciplina militares,
competem, entre outras, as seguintes atividades: I - polícia
ostensiva de segurança, de trânsito urbano e rodoviário, de
florestas e mananciais e a relacionada com a prevenção criminal,
preservação, restauração da ordem pública e defesa civil;
Vê-se, pois, que a Carta Magna
Federal de 1988 e a Constituição do Estado da Bahia subordinaram a
Corporação Policial Militar ao Governo Estadual, as quais
prescreveram também que a segurança pública é um dever estatal,
inexistindo, portanto, dúvidas acerca da responsabilidade por
eventual omissão ilegal nesse setor e quanto à imperatividade do
exercício desta atribuição (trata-se de um poder-dever). Convêm
registrar, nesse sentido, que as prerrogativas e competências
públicas, ao mesmo tempo em que constituem poderes para os
administradores e governantes, impõem-lhes o efetivo exercício
destas, vedando-se, conseqüentemente, a inércia, seja total ou
parcial, uma vez que os reflexos contraproducentes da inatividade
estatal atingem a coletividade como um todo. A esse respeito, insta
trazer a lume os ensinamentos de Marçal Justen Filho:
(...) NO ÂMBITO PUBLICÍSTICO
PRESUME-SE QUE TUDO O QUE, EM VIRTUDE DE LEI, FOR AUTORIZADO SERÁ
REPUTADO COMO OBRIGATÓRIO. OU SEJA, NÃO HÁ CABIMENTO EM IMAGINAR
QUE O DIREITO ATRIBUIRIA PODERES PARA QUE ALGUÉM ESCOLHESSE ENTRE
FAZER OU NÃO FAZER6.
Sendo assim, o poder de agir para o
administrador público constitui uma obrigação de atuar, vigorando,
portanto, o binômio conhecido como poder-dever. O administrado, por
seu turno, ante a inércia estatal, tem o direito subjetivo de exigir
do administrador a conduta comissiva imposta pela lei. José dos
Santos Carvalho Filho reitera essa mesma compreensão:
Corolário importante do poder-dever
de agir é a situação de ilegitimidade de que se reveste a inércia
do administrador: na medida em que lhe incumbe conduta comissiva, a
omissão (conduta omissiva) haverá de configurar-se como ilegal.
Desse modo, o administrado tem o direito subjetivo de exigir do
administrador omisso a conduta comissiva imposta na lei, quer na via
administrativa, o que poderá fazer pelo exercício do direito de
petição (art. 5º, XXXIV, “a”, da CF), quer na via judicial,
formulando na ação pedido de natureza condenatória de obrigação
de fazer (ou, para outros, pedido mandamental)7.
In casu, pode-se verificar que o
Estado da Bahia não vem cumprindo o seu dever constitucional de
propiciar segurança pública na 81ª Zona, eis que o contingente de
policiais militares lotado na mencionada comuna é demasiadamente
deficitário.
O número de policiais militares na
Zona, ordinariamente, encontra-se, excessivamente, abaixo do mínimo
necessário para garantir a segurança da população, repercutindo
em inegáveis violações ao direito à vida, à integridade e
incolumidade física, paz e segurança social da comunidade.
A ampliação do número de policiais
militares para garantir a segurança e o seu razoável aparelhamento
é ato estritamente vinculado, que não admite apreciação subjetiva
de qualquer espécie.
Assim, considerando que as normas
constitucionais supracitadas exigem que o Estado da Bahia preste
efetiva segurança pública à população como um todo, ao não
disponibilizar um número mínimo de policiais militares e
infra-estrutura adequada, o Ente Público viola a força normativa
das Constituições Estadual e Federal. Portanto, o Poder Executivo,
no exercício de suas atribuições, está estritamente vinculado às
normas constitucionais, dentre elas aquelas que estabelecem o direito
segurança pública e a preservação da ordem e da incolumidade das
pessoas e de seu patrimônio.
Neste sentido, não se trata de
matéria relativa ao poder discricionário do administrador, pois não
há que se falar em oportunidade e conveniência em obedecer aos
ditames constitucionais.
Evidente também que não restam
dúvidas que a segurança pública constitui serviço essencial,
dever do Estado e direito de todos, exercida para a preservação da
ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, sendo,
pois, imprescindível para o convívio social.
A garantia da segurança pública,
para os defensores das teorias contratualistas (teorias da origem
contratual do Estado – v.g. Hobbes, Spinosa, Locke e Rousseau),
constitui, inclusive, um dos alicerces basilares da própria vida em
sociedade e da formação do próprio Estado. Ou seja, no momento do
pacto social fundante, todos os indivíduos renunciaram a parcelas de
poder, para que, formando-se o Estado, fosse suprimida a barbárie e
a incivilidade.
LOCKE, AFIRMA, POR EXEMPLO, QUE A
NOÇÃO DE ESTADO BASEIA-SE NA VONTADE GERAL DE CRIAR UM ÓRGÃO QUE
FOSSE CAPAZ DE FAZER A JUSTIÇA E MANTER A PAZ.
ASSIM SENDO, A NEGATIVA EM PRESTAR
SEGURANÇA PÚBLICA AOS CIDADÃOS E DE MANTER A PAZ SOCIAL CONSTITUI
INEQUÍVOCO ATENTADO À PRÓPRIA NOÇÃO QUE SE TEM DE ESTADO.
A interrupção do serviço de
segurança pública, ou ainda, a sua prestação de forma
descontinuada ou deficitária, extrapola os limites da legalidade e
afronta a cláusula pétrea de respeito à dignidade humana,
porquanto o cidadão necessita utilizar-se desse serviço público,
indispensável à sua vida em comunidade.
A Lei Federal n. 10.277/2001, que
institui medidas para assegurar o funcionamento de serviços e
atividades imprescindíveis à segurança pública, como não poderia
deixar de ser, preconiza em seu artigo 3º, que “consideram-se
atividades e serviços imprescindíveis à preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, para os fins
desta Lei: I - o policiamento ostensivo; VIII - o registro de
ocorrências policiais.”
Vê-se, pois, que a questão da
segurança pública é prioritária não só porque está em jogo a
ordem pública e a incolumidade das pessoas e de seu patrimônio, mas
também porque a própria noção de Estado depende da manutenção
daquela, sendo esta classificada ainda como serviço público
essencial e necessário para a sobrevivência do grupo social.
Impõe-se, enfim, que o Poder
Judiciário cumpra, no presente caso, sua missão institucional de
guardião dos direitos e garantias fundamentais, restabelecendo a
força normativa da Carta Magna de 1988 e da Constituição Estadual,
requisitando-se força policial e a presença das forças armadas.
DOS PEDIDOS
PELO EXPOSTO, INVOCANDO O
PROCEDIMENTO PREVISTO NO ART. 96, §§ 5º E SS., DA LEI 9.504/97,
REQUER O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL O DEFERIMENTO DOS PLEITOS
ABAIXO, VISANDO A PRESERVAÇÃO DA ORDEM E SEGURANÇA PÚBLICAS:
Nestes termos, requer:
1 – Concessão da liminar,
proibindo-se carreatas e passeatas, ou qualquer outra forma de
manifestação política móvel, até ulterior decisão judicial,
fixando-se, para a hipótese de descumprimento, de multa diária no
importe de R$ 50.000,00, solidária entre partido ou coligação e
candidatos participantes;
2 - Diante da chegada de reforço
policial, que seja liberada a realização de tais eventos;
3 – QUE CONSTE NA NOTIFICAÇÃO QUE
EVENTUAL DESCUMPRIMENTO DA DECISÃO PODERÁ CARACTERIZAR TAMBÉM O
CRIME DE DESOBEDIÊNCIA, DENTRE OUTROS DELITOS, INCLUSIVE,
ELEITORAIS.
4 - De maneira alternativa e/ou
sucessiva, caso indeferida a suspensão e/ou proibição acima
perquirida, ou caso deferida, que seja doravante exigida comunicação,
com, no mínimo, 24 horas de antecedência, ao Juízo e à Polícia
Militar de qualquer aglomeração com mais de 10 (dez) participantes,
com fins políticos, observando-se, ainda:
4.1 – que seja informado o local da
aglomeração;
4.2 – que seja informado o horário
de início e término da aglomeração;
4.3 – que, além do local, seja
informado o trajeto detalhado de por onde passará a aglomeração,
especificando-se, hora a hora, onde se encontrará a aglomeração,
facilitando-se, assim, o trabalho da Polícia Militar;
4.4 – que sejam informados os nomes
de todos os candidatos que participarão da aglomeração, com a
assinatura dos candidatos indicados; 4.5 – Na hipótese de
descumprimento de qualquer das medidas supra, que seja fixada multa
diária, por obrigação, de R$ 50.000,00.
5 – que o MM Juízo determine que a
Polícia Militar dissolva, com uso da força, se preciso for,
qualquer manifestação que não observe o dever supracitado,
previsto constitucionalmente, inclusive, de comunicação à Polícia,
e apreenda todos os veículos utilizados na aglomeração, sob pena
de multa ao policial omisso no importe de R$ 1.000,00.
6 – Na hipótese de deferimento da
suspensão ou proibição, que se determine que a Polícia Militar
dissolva, com uso da força, se preciso for, qualquer manifestação
política móvel e apreenda todos os veículos utilizados na
aglomeração, sob pena de multa ao policial omisso no importe de R$
1.000,00.
7 - Notificação dos representados
para, querendo, apresentarem defesa no prazo de 48 horas (após
certificação do Oficial de Justiça);
8 – Divulgação da decisão na
imprensa dos três Municípios que integram a Zona , visando dar
ampla publicidade à medida, intimidando futuras condutas similares e
objetivando tranquilizar a população assustada e amedrontada;
9 – REQUER QUE SE REQUISITE AUMENTO
DO CONTINGENTE DE POLICIAIS MILITARES, para número não inferior a
06 policiais, número muito aquém do recomendado pela Organização
das Nações Unidas – ONU – que, para esta Zona, seria de 320
policiais (conforme explicitado acima);
10 - Julgamento procedente do pedido
da presente representação, condenando os Representados a se
absterem de realizarem carreatas e passeatas, até ulterior decisão
judicial, pelas razões acima escandidas e cumprirem as demais
solicitações supra, sob pena de pagamento de multa diária.
N. Termos,
P. Deferimento.
Olindina, 03 de outubro de 2012.
Marcos José Passos O. Santos
PROMOTOR ELEITORAL"
1SANTOS,
Juarez Cirino. Direito
Penal: Parte
geral. 4a
ed. Florianópolis: Conceito editorial, 2010. p. 50.
3MENDES,
Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo
Gonet. Curso
de Direito Constitucional.
2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 241/286.
4MENDES,
Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo
Gonet. Curso
de Direito Constitucional.
2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
5Artigo
187 do Código Civil
7CARVALHO
FILHO, José dos Santos. Manual
de Direito Administrativo.
14ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. 34 p.
1 Comentários
Bela peça. Recheada de informações importantes. A liminar foi concedida? Gostaria de receber o número do processo para acompanhamento.
ResponderExcluirObrigado e boas eleições.