Na noite de ontem, o juiz José Brandão, responsável pela vara da infância de Conceição da Feira-BA, condenou um adolescente no prazo máximo, qual seja, 3 anos, previsto no ECA-Estatuto da Criança e do Adolescente, pois o “representado”(acusado) na noite de 28/08/12, por volta das 22:30, marcou um encontro com a vítima, sua ex-namorada, que estava grávida dele, e ceifou-lhe a vida, mediante golpes, com pedaço de estaca de madeira.
O crime ocorreu em 2012, mas o adolescente só foi apreendido, em 18 de julho de 2014.
Segundo o ECA, um adolescente só pode passar 45 dias apreendido e, se a sentença não for proferida em tal prazo, o menor infrator tem que ser posto em liberdade, algo “lamentável”, conforme critica o juiz.
No caso concreto, a 1ª audiência foi feita em pleno feriado local, dia 23/07/14 para que isso não ocorresse e como a sentença foi proferida no último dia do prazo, o menor vai ter que esperar mais 02 anos para ser liberado. É que segundo o ECA, nenhum adolescente pode continuar internado quando completar 21 anos – no caso julgado, o acusado já tem 19 anos.
O adolescente resolveu cometer o crime porque começou a se relacionar com uma nova namorada e a vítima insistia em reatar o relacionamento, pois estava grávida dele.
Diante da pouquidade da punição, como para caso concreto, em que vítima foi assassinada, grávida e por um menor de 17 anos, o juiz chegou a recomendar no final da sentença que o Congresso Nacional reduza a maioridade penal, nos seguintes termos: “ Recomende-se ao Congresso Nacional a Redução da Maioridade Penal ou, enquanto isso não ocorrer, que atos infracionais violentos como este recebam uma resposta estatal de 10 anos de internação!”, concluiu o magistrado.
Segundo o Dr.José Brandão, o TJBA tem quem alterar sua resolução que prevê abertura de sindicância quando o juiz passar alguns dias do prazo para proferir a sentença. “Já há decisões do TJSP que informam que se demorar até 60 dias para a ser proferida a sentença, não é motivo para liberar o adolescente. Há também PL no Senado para ampliar o prazo de 45 dias para 90 dias. Também há Pls na Câmara federal tornandoo prazo interminado”, disse o juiz.
Aliás, no caso concreto, por estratégia da defesa, o prazo f quase foi excedido, ou seja, os Tribunais têm que criar jurisprudência, para que, quando o eventual excesso de prazo ocorrer por culpa da defesa, desprezar-se qualquer excesso de prazo, como já se entende no processo penal, pois nosso nosso sistema não permite à parte se beneficiar da própria torpeza”, concluiu o juiz.
Da decisão, cabe ainda recurso de apelação.
Vejam a sentença, com omissão da identificação porque o ECA, em seu art. 143, não permite divulgações do nome do adolescente em conflito com a lei.



SENTENÇA

Autos nº: 0000282-20.2012.805.0061


…..... sofre representação por parte do M.P., por meio de sua Ilustre Representante Legal, em virtude dos fatos narrados na peça inicial, equivalente à figura típica do art. 121, § 2º, II e IV do Código Penal, configurando, assim, ato infracional, à luz do disposto no artigo 184 da Lei Protetiva da Criança e do Adolescente.
Recebida a representação (fls. 138/139), quando foi decretada a internação provisória do representado.
Guia de Internação Provisória pelo período de quarenta e cinco dias (45), a partir do dia 18 de julho de 2013, às fls. 148.
O adolescente e sua genitora foram ouvidos na Audiência de Apresentação às fls. 149/151.
Às fls. 191/205, o representado foi intimado para apresentar a defesa prévia.
Às fls. 59/62, foi juntado o Laudo de Exame Cadavérico da Vítima e certidão de óbito de fls. 29 e fotografias da vítima às fls. 30.
Verifica-se às fls. 59/62, o Laudo de Exame Pericial, lesões na região frontal mediana e frontal esquerda, com ferida no couro cabeludo e escoriações, equimoses na região dos lábios e escoriações no queixo, além de outras feridas suturadas. Constatada também, edema encefálico acentuado, sendo a causa da morte tramatismo cranio-encefálico por meio contundente.
Relatório informativo às fls. 173/175.
Designada audiência de instrução e julgamento, as testemunhas compareceram, bem como o representado, assistido pelo Advogado constituído (fls. 176/189).
O adolescente foi apreendido no dia 18/07/2014 (fls. 148) após decisão internação provisória, fls. 144/145, por ter sido representado pelo MP como responsável pelo ato infracional equiparado ao homicídio qualificado que teve como vítima ADRIANA OLIVEIRA DO NASCIMENTO, ex - namorada e grávida do então adolescente, fato ocorrido dia 28/08/2012, na cidade de Conceição da Feira-BA.
Declarações do adolescente prestada as fls. 150/151, prestadas perante o Magistrado em pleno feriado local.
O Ministério Público, em alegações finais, requereu a aplicação das medidas socioeducativas de internação eis que acusa adolescente de ter matada a vítima com diversos golpes utilizando-se um pedaço de “barrote com prego”, previstas no artigo 112, VI, combinado com o artigo 121 e seguintes da Lei nº 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, em seu prazo máximo.
Por sua vez, a Defesa, fora do prazo, fixado em audiência, em sede de alegações finais, requereu seja julgada improcedente a representação, com a consequente absolvição do adolescente, ou, alternativamente, de liberdade assistida.
Vieram-me os autos conclusos.
Em síntese, é o relato.
Tudo bem visto e ponderado, passo a DECIDIR:

DA FUNDAMENTAÇÃO

Não merecem prosperar as alegações da defesa, conforme ficará demonstrado nas provas adiante explicitadas, em que pese o Representado ter negado a acusação tanto na fase policial, tanto na fase judicial, o que não é de se surpreender, eis que estava acompanhado de advogado.

As testemunhas ouvidas depuseram contra a versão do então adolescente, senão vejamos:
O declarante ANTONIO MÁRIO DO NASCIMENTO alegou que a vítima recebeu uma ligação por volta das 22:30h do dia do fato; “que a vítima comentou com a mãe Maria da Glória, que iria atender uma ligação de Sara, uma tia do representado; QUE o representado era a única pessoa que a vítima procuraria naquele horário, diante do que ela sentia por ele; QUE jamais a vítima atenderia um chamado de UIRIS, visto que este é perigoso e fugitivo, mas sendo franco o representado é mais perigoso que UIRIS: QUE logo depois do fato o representado passou uma temporada fora da cidade, desapareceu; QUE UIRIS já não morava mais na cidade; QUE depois que UIRIS separou-se de vítima não voltaram mais a se encontrar; (…) QUE o representado sabia que a vítima estava grávida; QUE o motivo de o acusado ter feito isso (cometido o crime) foi o fato deste ter arranjado uma namorada nova; (…) QUE estava acontecendo um triângulo amoroso entre os envolvidos. QUE depois que o representado soube da gravidez, separou-se dela. QUE …..... agredia a vítima constantemente”.


A testemunha de fls. 181, depôs em Juízo, o seguinte:

Que a vítima insistia muito em reatar o namoro com a adolescente; QUE a vítima chegou a falar para o adolescente e à depoente que estava grávida e que queria reatar por isso; QUE falou para a adolescente sobre a gravidez da vítima; QUE o mesmo falou se confirmasse a gravidez assumiria o filho, mas não voltaria a se relacionar com a vítima; (…) QUE a mãe da vítima disse que a vítima havia sido espancada e jogada no matagal; QUE quando a vítima saiu dizendo que resolveria um problema no dia dos fatos, por volta das 22:00 horas, a depoente chegou a suspeitar que seria algo com o representado, como também poderia não ser; QUE soube que UIRIS estava na cidade que a vítima estava com medo, pois estava grávida e que a vítima ainda disse que se URIS soubesse da gravidez, a mataria; QUE a vítima tinha medo de UIRIS; QUE houve comentário na cidade que foi o representado quem cometeu o crime; (…) QUE viu o representado por volta do final do ano, mas no mês de agosto não o viu na cidade; (…) QUE acha que, com o medo que a vítima estava de UIRIS, a vítima não se encontraria com o mesmo às 22:00, sozinha, porque tinha medo dele; QUE a vítima falou como se fosse fazer algo de bom, pois estava feliz ao telefone; (…) QUE confirma que a única pessoa que a vítima sairia tão feliz para se encontrar seira o representado”.

O depoimento do policial é bastante sugestivo para esclarecer quem foi o autor do homicídio. Conforme se vê as fls. 183, o policial civil informa que a polícia passou a investigar o fato e quando …..... foi até a delegacia, disse que não possui celular e usava o da sua mãe e que era da operadora claro. Ao pedir o histórico de ligações do celular da vítima, ficou comprovado que ela recebeu uma ligação da TIM que pertencia a tia do representado. Disse o depoente que a testemunha Mariana havia dito, na DEPOl, que Adriana, ora vítima, tinha recebido uma ligação e que iria se encontrar com uma pessoa que lhe ligou naque dia e horário, marcando encontro. O referido depoente ainda disse que ao procurar pelo Representado, o mesmo não estava na cidade, e, na noite do fato, as ligações do telefone interceptado partiram de São Gonçalo dos Campos, justamente o telefone da tia do representado, que fazia uso do celular dela.

O policial ainda disse que o URIS não ficava na cidade, era foragido e que polícia estava sempre a sua procura e que Sara, tia do representado, não usava o celular alvo da investigação e quem o usava era o “representado”.

A mãe da vítima disse que o representado ligou para ela dizendo que não assumiria o filho de Adriana e que Adriana não se encontrava há muito tempo com UIRIS, informando também que houve, em 23/07/2012, uma discussão envolvendo Jesana (mãe de Uini), Uini (nova namorada do representado) e a vítima, tendo todas sido encaminhadas para a delegacia. Afirmou que o comentário da cidade que o autor do crime foi o representado.

A testemunha de fls. 188 informou que o comentário da cidade é que o autor do crime teria sido o representado, pois, quando as pessoas foram procurá-lo, o mesmo encontrava foragido e o motivo da separação da vítima foi o fato de ele ter começado o namoro com a filha de Jesana, conhecido como Uini.

O representado informou que não ligou para a vítima e disse que havia comentários que a vítima estava grávida, negando a acusação, não tendo no seu interrogatório demostrado nenhuma tristeza com o fato, evidenciando-se, no seu comportamento, acomodação com a acusação, em plena autodefesa...

Da análise dos depoimentos prestados pelo representado, evidencia-se nítida incoerência na versão apresentada, pois a investigação policial concluiu de forma inequívoca que, no dia e horário do crime, o representado efetuou e recebeu ligações da vítima, conforme fls. 81, inclusive o telefone XXXXXXXXXX, pertencente à tia do representado Maria Auxiliadora Oliveira de Souza, (fls. 106) era utilizado pelo Representado há três anos, como bem demostra as ligações às fls. 78, recebidas pelo celular da vítima, ao menos em 06 ligações, conforme ralata a investigação de fls. (108/123).
Enfim, as testemunhas acima depuseram no sentido de que o adolescente foi o principal suspeito do ato infracional equiparável a homicídio qualificado, previsto no artigo 121, § 2º, II e IV do Código Penal, pois, naquela noite do crime, apenas a vítima sairia com o adolescente, pois ainda tentava reatar o namoro com o mesmo, já que estava grávida dele, inclusive o representado tinha ciência da referida gravidez. Jamais a vítima iria se encontrar àquele horário com o indivíduo UIRIS, pois tinha tinha medo dele, por se tratar de um ex- presidiário foragido, não tinha porque se encontrar com ele, indivíduo com quem nunca mais tinha se encontrado desde a que se separou dele, fato ocorrido muito antes do homicídio.
Já o representado se evadiu da cidade após o ato infracional hediondo, visando escapar da persecursão, e, por fim, a quebra do sigilo telefônico demostra que o então adolescente recebeu ligações e as fez para a vítima, justamente no horário em que a mesma marcou para se encontrar com ele na noite do crime.
Desta forma, as provas carreadas aos autos são incontestáveis, claras e seguras, quanto à materialidade e a autoria, ensejando um veredicto sem qualquer dúvida de que o representado na noite de 28/08/12, por volta das 22:30, encontrou-se com a vítima e ceifou-lhe a vida, mediante golpes, com pedaço de estaca de madeira.
Surpreende, portanto, como agiu o então adolescente, cometendo ato infracional gravíssimo. Indiscutivelmente, o Representado necessita de orientação técnica para que seja reintegrado à comunidade e possa, assim, refletir acerca da gravidade dos atos praticados, em busca de resgatar o respeito que se deve ter com as pessoas.
Em outro plano, não podemos desconsiderar a indignação causada em toda comunidade na forma com que o representado agiu, que exige a própria intervenção do Poder Judiciário de modo a inibir a prática de infrações desta natureza, como forma de assegurar a credibilidade da Justiça.
Assim, a medida sugerida pelo Ministério Público é a que se afigura como a mais adequada hipótese nesse procedimento, qual seja, a de internação em estabelecimento educacional. A internação tem cabimento na hipótese de ato infracional violento, segundo o art. 122, I e II, da Lei nº 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
Torna-se justificável a aplicação da medida extrema, inclusive o homicídio é equiparável a ato infracional hediondo, o que justifica ainda mais a mencionada medida socioeducativa, sendo o referido ato infracional de grande repercussão social na referida comunidade.

DO DISPOSITIVO

Pelo exposto, e por tudo mais que dos autos consta JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na REPRESENTAÇÃO e, por consequência, aplico ao representado …...., já qualificado nos autos, a MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO em estabelecimento educacional pelo por prazo indeterminado (TRÊS ANOS como sugestão), com fulcro no art. 122, I e II, da Lei nº 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, por ser a mais adequada ao presente caso e que atenda a finalidade da lei, com reavaliação semestral mediante apresentação de relatórios técnicos, elaborados pela unidade competente. Após o período de internação, o adolescente ser deverá submetido a Liberdade Assistida, nos termos do art. 121, § 4º, da Lei nº 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
Expeça-se guia de internação definitiva, mantendo-se o Representado onde se encontra internado.
Cientifique-se o representado dos seus direitos previstos nos artigos 123 a 125 da Lei nº 8.069/1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
Recomende-se ao Congresso Nacional a Redução da Maioridade Penal ou, enquanto isso não ocorrer, que atos infracionais violentos como este recebam uma resposta estatal de 10 anos de internação!
Publique-se.
Arquive-se cópia desta decisão.
Intime-se.

Conceição da Feira/BA, 01 de setembro de 2014


Juiz de Direito Em substituição”

INFORMOU CLECIA ROCHA DA ASSESSORIA

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