Acusado que disse "suspeitar do governo" em resposta à invasão ao seu comitê eleitoral ñ comete crime eleitoral, decide STF
O Plenário, por maioria, conheceu de embargos infringentes opostos de acórdão da Segunda Turma e deu-lhes provimento para absolver o acusado da prática do crime de calúnia eleitoral.
Afastada a preliminar de prescrição, o Supremo Tribunal Federal (STF) rememorou entendimento firmado na AP 863, segundo o qual os embargos infringentes são cabíveis contra acórdão condenatório não unânime, desde que proferidos dois votos absolutórios, em sentido próprio, no julgamento de mérito de ação penal pelas Turmas da Corte.
Consignou que, no entanto, o caso concreto impõe distinguishing, a permitir os infringentes com um voto absolutório em sentido próprio. O quórum na sessão estava incompleto. A Turma contava com quatro ministros e a exigência de dois votos conduziria, por si só, à absolvição do acusado. Além disso, a admissibilidade dos embargos deu-se em momento anterior à mencionada construção jurisprudencial.
Dessa maneira, excepcionalmente, o Tribunal reiterou a admissão dos embargos. A parte não pode ser prejudicada pela ausência do quórum completo.
Os ministros Edson Fachin e Roberto Barroso aduziram que, havendo quatro votos com um divergente na linha da absolvição própria, o procedimento a ser adotado é aguardar-se a composição plena. A ministra Cármen Lúcia registrou conhecer dos embargos sem se vincular ao posicionamento. O ministro Marco Aurélio frisou que a Turma funcionou com o quórum exigido regimentalmente suplantado e atuou como órgão revisor. O enfoque jurisprudencial a exigir dois votos vencidos ocorreu dois anos após o surgimento do interesse em recorrer. A situação jurídica em apreço se enquadrou no parágrafo único do art. 609 (1) do Código de Processo Penal (CPP).
Vencido o ministro Celso de Mello na preliminar de conhecimento dos embargos. Para ele, a necessidade dos dois votos deve prevalecer diante da existência de quórum regimental a legitimar a realização de julgamento por órgão fracionário do STF, especialmente na espécie, em que presentes quatro ministros.
No mérito, o STF absolveu o acusado. Considerou que a prova da lesividade da conduta há de ser aferida no curso da ação penal, perquirindo-se, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, a configuração ou não da materialidade delitiva, acima de dúvida razoável. O condenado, cujo comitê fora invadido, teria dito suspeitar do governo, de forma genérica. O áudio da entrevista beneficia a versão apresentada pela defesa, e a manifestação acoimada na denúncia revela-se lacônica.
Ademais, o depoimento da vítima – sujeito passivo direto dos crimes contra a honra – assume papel de relevância, porquanto é o titular do bem jurídico protegido pela norma criminalizadora. No caso, a suposta vítima pronunciou-se nos autos, expressando que tudo não passou de querela inerente ao calor do debate eleitoral e que seus efeitos se exauriram naquele contexto, sem sofrer qualquer ofensa a sua honra pessoal. Consectariamente, não há prova segura da materialidade da conduta.
O ministro Alexandre de Moraes enfatizou a falta de elemento subjetivo do tipo e que a querela não chegaria a ser calúnia.
Vencidos a ministra Cármen Lúcia e o ministro Celso de Mello, que negaram provimento aos embargos. A ministra ressaltou que a manifestação do ofendido foi trazida somente nos infringentes e que o fundamento de a pessoa não se sentir ofendida não altera uma ação pública incondicionada. Já o ministro rejeitou os embargos também por constatar ter sido correta a sentença penal condenatória proferida pela Justiça Eleitoral e mantida pela Segunda Turma.
(1) CPP: “Art. 609. (...) Parágrafo único. Quando não for unânime a decisão de segunda instância, desfavorável ao réu, admitem-se embargos infringentes e de nulidade, que poderão ser opostos dentro de 10 (dez) dias, a contar da publicação de acórdão, na forma do art. 613. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto de divergência. ”
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