PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL 

Processo n.  0000017-89.2020.805.0076 –
Representado:  XXX

D E C I S Ã O   

Trata-se de pedido de revogação de prisão preventiva em favor de  xxxxxxX suspeito de participar do homicídio consumado ocorrido em xxx , por volta das 07h40, no bairro Cidade Nova, nesta cidade de xxx BA, que vitimou o Policial Militar xxx.


Alega a defesa, resumidamente, que;


- Imputado e PRIMARIO, possui MORADIA FIXA, mediante contrato de aluguel, ESTAVA DEVIDAMENTE EMPREGADO, sendo a ÚNICA FONTE DE RENDA DA FAMILIA 

- Recomendação n°62 do CNJ de 17/03/2020 — REAVALIAÇAO DA PREVENTIVA DIANTE DO COVID-19 Como e de conhecimento nosso, desde o início do mês de março/2020, o Brasil vem sendo afligido pela propagação da doença, popularmente conhecida como "Corona Vírus" (COVID-19), que tem forte propagação, inclusive pelo mero contato físico entre as pessoas, sendo necessário o uso de produtos de limpeza de modo constante, além de equipamentos específicos, a exemplo de máscaras e luvas, com intuito evitar ao máximo a contaminação, a qual, de acordo com os cientistas, poderá ser evitada em 2 (dois) ou 3 (três) meses, caso seguidas todas as recomendações dispostas. Ocorre que, em função de tal vírus, o CNJ também se manifestou, não apenas mediante a suspensão de prazos e audiências até o dia 30/04/2020, mas por meio de várias recomendações, dentre as quais a de número 62.


- o Acusado faz parte do GRUPO DE RISCO, uma vez que possui doença respiratória, qual seja (VERIFICAR QUAL A DOENÇA),


O Ministério Público manifestou-se pela manutenção da prisão preventiva e disse :


Com efeito, os elementos probatórios constantes na ação penal rafada dão conta da ocorrência de crime de homicídio qualificado; a vítima, um Policial Militar, foi morta de forma brutal, para o que foram
utilizadas três armas de fogo, sendo colhida quando se deslocava do local de residência, XXXXX
(…)


Por outro lado, a prova testemunhal colhida fornece indícios veementes da existência de conflito anterior entre a vítima e o ora requerente, nascido de um conturbado relacionamento amoroso xxxx

xxxxxx




Decido.


O Art. 312. do CPP diz que a prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.


Por sua vez, o art. 282 do CPP , § 5º, afirma que “o juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a medida cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem”.


Há, em tese, prova da materialidade do homicídio, cuja pena mínima supera 4 anos. Há indícios de autoria, consubstanciados no fato de que xxxx  morto mantinha relacionamento conturbado com xxxxx e que fora encontrado com o representado uma das armas utilizadas no homicídio do Policial, fato esse comprovado, em tese.


Quanto aos pressupostos da prisão preventiva (fumus COMISSI DELCITI), exige a lei prova da existência do crime (delito) e indícios suficientes de que o indiciado ou acusado seja o autor, conforme disposto no artigo 312, in fine, do Código de Processo Penal.
No caso em apreço verifico a existência de provas que atestam, em tese, a ocorrência do fato, seja pelo laudo pericial que concluiu ser a arma encontrada com o representado uma das armas usadas no crime, seja pelo testemunho já colecionado que indicam o conflito anterior entre a vítima e o representado.


Por outro lado, cabe analisar se estão presentes indícios suficientes de que o representado seja o autor dos delitos.


Como bem acentuado pelo mestre Fernando da Costa Tourinho Filho, em sua obra anteriormente citada (p. 403), “não existe na legislação processual pátria norma legal definindo o que seja indício suficiente da autoria. A essa conclusão deverá chegar o Magistrado, de forma prudente, por meio da análise detida dos elementos de convicção produzidos nos autos, sempre voltado à excepcionalidade dessa medida de caráter cautelar”.


Com relação ao tema da garantia da ordem pública, faço menção à manifestação já conhecida da Segunda Turma do S. T. Federal HC nº 88.537/BA e recentemente sistematizado nos HC’s 89.090/GO e 89.525/GO acerca da conformação jurisprudencial do requisito dessa garantia. Nesses julgados, o STF assevera que o referido requisito legal envolve, em linhas gerais e sem qualquer pretensão de exaurir todas as possibilidades normativas de sua aplicação judicial, as seguintes circunstâncias principais:
i) a necessidade de resguardar a integridade física ou psíquica do paciente ou de terceiros;
ii) o objetivo de impedir a reiteração das práticas criminosas, desde que lastreado em elementos concretos expostos fundamentadamente no decreto de custódia cautelar; e
iii) associada aos dois elementos anteriores, para assegurar a credibilidade das instituições públicas, em especial do poder judiciário, no sentido da adoção tempestiva de medidas adequadas, eficazes e fundamentadas quanto à visibilidade e transparência da implementação de políticas públicas de persecução criminal.( informativo Jurisprudência nº 500 do STF).


A jurisprudência da Corte consolidou o entendimento de que a liberdade de um indivíduo suspeito da prática de crime somente pode sofrer restrições se houver decisão judicial devidamente fundamentada, amparada em fatos concretos e não apenas em hipóteses ou conjecturas, ou na gravidade do crime.


O presente caso, conforme tantos outros idênticos que vem sendo praticados neste Município (prática de homicídio), sem dúvidas vêm gerando uma grande repercussão social, em vista da existência de diversas pessoas que vem sendo vitimadas pela prática de atos ilícitos desta natureza, o que torna necessário a adoção de uma medida que venha acautelar a sociedade e preservar a credibilidade da justiça.
(…)


Outrossim, verifica-se, in casu, a hipótese do periculum libertatis consistente na necessidade de garantir a ordem pública, bem como para assegurar a aplicação da lei penal. Consoante escólio de Guilherme de Souza Nucci1, a ordem pública compreende o trinômio gravidade da infração, repercussão social e periculosidade do agente. 

Como é cediço, garantir a ordem pública é, além de impedir a reprodução de fatos criminosos , acautelar o meio social e a credibilidade da justiça . Neste sentido, já se manifestou o mestre JULIO FABBRINE MIRABETE2 :

Mas o conceito de ordem pública não se l imita a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas também a acautelar o meio social e a credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e de sua repercussão.
Com efeito, a medida cautelar revela - se imprescindível a fim de obstaculizar a reiteração criminosa de conduta de nefasta repercussão social.


Assim, cometer delitos contra policiais, põe em jogo a credibilidade das instituições públicas, e, de alguma forma, estimula a possibilidade de uma vindita por parte dos agentes policiais, estando evidenciados os requisitos acima colacionados pelo STF para decretação da prisão cautelar, consoante noticiado no informativo e Jurisprudência nº 500.


Ademais, restou noticiado nos autos que os suspeitos do crime fugiram após a pártica do fato, sendo que ao menos dois deles ainda se encontram desconhecidos e, portanto, foragidos, já aqui estando presente mais dois requisitos para a prisão preventiva, quais sejam, conveniência da instrução criminal e assegurar a aplicação da lei penal.


Acerca da situação da pandemia de coronavírus e da Recomendação nº 62/20 no CNJ, além de se tratar, no caso concreto, em tese, de crime violento, segundo a novel Lei 13.979/20 e Portaria Nº 356 do Ministério da Saúde, para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, poderão ser adotadas, entre outras, as seguintes medidas:

I - isolamento;
II – quarentena;

Assim, não é razoável que presos provisórios ou não, acusados de crimes violentos, sejam colocados em liberdade de forma irrestrita.

Ao contrário, há orientação, no presente momento, para restringir a circulação de pessoas. Liberar, indiscriminadamente, quem está preso vai de encontros à à orientação da Lei 13.979/20 e Portaria Nº 356 do Ministério da Saúde, inclusive manter pessoas presas por crime violento atende ao quanto na Recomendação Nº 62/2020 do CNJ, no seu art. 4º,I, c, verbis:


Art. 4° Recomendar aos magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes:

I — a reavaliação das prisões provisórias, nos termos do art. 316, do Processo Penal, priorizando-se:

a) mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por até doze anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, Código de criança e pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco;
b- pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, que estejam sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão do sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus;
c- prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa) dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa


Dever-se-á, doravante, interpretar o parágrafo único do art. 316 do CPP, - redação dada pela Lei 13.964/19, que previu a revisão da prisão preventiva a cada 90 dias-, “cum grano salis”, sob pena de, ultrapassado o prazo, automaticamente, transformar-se a prisão em ilegal para casos como os da alínea “c” do art. 4,I, da Recomendação do CNJ acima citada .

Posto isso, acolho a promoção do Ministério Público e  indefiro INDEFIRO O PEDIDO do requerente diante da fundamentação acima exposta

Intime-se e Ciência ao Ministério Público.

xxxxxxxx

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